sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Notícia do STF. Quarta-feira, 10 de agosto de 2011. Aprovado em concurso dentro das vagas tem direito à nomeação.


Aprovado em concurso dentro das vagas tem direito à nomeação.

O Supremo Tribunal Federal (STF) negou provimento a um Recurso Extraordinário (RE) 598099 em que o estado do Mato Grosso do Sul questiona a obrigação da administração pública em nomear candidatos aprovados dentro no número de vagas oferecidas no edital do concurso público. A decisão ocorreu por unanimidade dos votos.

O tema teve repercussão geral reconhecida tendo em vista que a relevância jurídica e econômica da matéria está relacionada ao aumento da despesa pública. No RE se discute se o candidato aprovado em concurso público possui direito subjetivo à nomeação ou apenas expectativa de direito.

O estado sustentava violação aos artigos 5º, inciso LXIX, e 37, caput e inciso IV, da Constituição Federal, por entender que não há qualquer direito líquido e certo à nomeação dos aprovados, devido a uma equivocada interpretação sistemática constitucional. Alegava que tais normas têm o objetivo de preservar a autonomia da administração pública, “conferindo–lhe margem de discricionariedade para aferir a real necessidade de nomeação de candidatos aprovados em concurso público”.

Boa-fé da administração

O relator, ministro Gilmar Mendes, considerou que a administração pública está vinculada ao número de vagas previstas no edital. “Entendo que o dever de boa-fé da administração pública exige o respeito incondicional às regras do edital, inclusive quanto à previsão das vagas no concurso público”, disse o ministro, ao ressaltar que tal fato decorre do “necessário e incondicional respeito à segurança jurídica”. O STF, conforme o relator, tem afirmado em vários casos que o tema da segurança jurídica é “pedra angular do Estado de Direito, sob a forma da proteção à confiança”.

O ministro relator afirmou que quando a administração torna público um edital de concurso convocando todos os cidadãos a participarem da seleção para o preenchimento de determinadas vagas no serviço público, “ela, impreterivelmente, gera uma expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas nesse edital”. “Aqueles cidadãos que decidem se inscrever e participar do certame público depositam sua confiança no Estado-administrador, que deve atuar de forma responsável quanto às normas do edital e observar o princípio da segurança jurídica como guia de comportamento”, avaliou.

Dessa forma, segundo Mendes, o comportamento da administração no decorrer do concurso público deve ser pautar pela boa-fé, “tanto no sentido objetivo quanto no aspecto subjetivo de respeito à confiança nela depositada por todos os cidadãos”.

Direito do aprovado x dever do poder público

De acordo com relator, a administração poderá escolher, dentro do prazo de validade do concurso, o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, “a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público”

Condições ao direito de nomeação

O ministro Gilmar Mendes salientou que o direito à nomeação surge quando se realizam as condições fáticas e jurídicas. São elas: previsão em edital de número específico de vagas a serem preenchidas pelos candidatos aprovados no concurso; realização do certame conforme as regras do edital; homologação do concurso; e proclamação dos aprovados dentro do número de vagas previstos no edital em ordem de classificação por ato inequívoco e público da autoridade administrativa competente.

Conforme Mendes, a acessibilidade aos cargos públicos “constitui um direito fundamental e expressivo da cidadania”. Ele destacou também que a existência de um direito à nomeação limita a discricionariedade do poder público quanto à realização e gestão dos concursos públicos. “Respeitada a ordem de classificação, a discricionariedade da administração se resume ao momento da nomeação nos limites do prazo de validade do concurso, disse.

Situações excepcionais

No entanto, o ministro Gilmar Mendes entendeu que devem ser levadas em conta "situações excepcionalíssimas" que justifiquem soluções diferenciadas devidamente motivadas de acordo com o interesse público. “Não se pode ignorar que determinadas situações excepcionais podem exigir a recusa da administração de nomear novos servidores, salientou o relator.

Segundo ele, tais situações devem apresentar as seguintes características: Superveniência - eventuais fatos ensejadores de uma situação excepcional devem ser necessariamente posteriores à publicação de edital do certame público; Imprevisibilidade - a situação deve ser determinada por circunstâncias extraordinárias à época da publicação do edital; Gravidade – os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis devem ser extremamente graves, implicando onerosidade excessiva, dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das regras do edital; Crises econômicas de grandes proporções; Guerras; Fenômenos naturais que causem calamidade pública ou comoção interna; Necessidade – a administração somente pode adotar tal medida quando não existirem outros meios menos gravosos para lidar com a situação excepcional e imprevisível.

O relator avaliou a importância de que essa recusa de nomear candidato aprovado dentro do número de vagas seja devidamente motivada “e, dessa forma, seja passível de controle por parte do Poder Judiciário”. Mendes também salientou que as vagas previstas em edital já pressupõem a existência de cargos e a previsão de lei orçamentária, “razão pela qual a simples alegação de indisponibilidade financeira desacompanhada de elementos concretos tampouco retira a obrigação da administração de nomear os candidatos”.

Ministros

Segundo o ministro Celso de Mello, o julgamento de hoje “é a expressão deste itinerário jurisprudencial, que reforça, densifica e confere relevo necessário ao postulado constitucional do concurso público”. Por sua vez, a ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha afirmou não acreditar “numa democracia que não viva do princípio da confiança do cidadão na administração”.

Para o Marco Aurélio, “o Estado não pode brincar com cidadão. O concurso público não é o responsável pelas mazelas do Brasil, ao contrário, busca-se com o concurso público a lisura, o afastamento do apadrinhamento, do benefício, considerado o engajamento deste ou daquele cidadão e o enfoque igualitário, dando-se as mesmas condições àqueles que se disponham a disputar um cargo”. “Feito o concurso, a administração pública não pode cruzar os braços e tripudiar o cidadão”, completou.

EC/AD


Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=186382 (sítio do Supremo Tribunal Federal - STF)

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Artigo publicado no Jornal Meio Norte do dia 07 de julho de 2011 (página A/2)

FUTEBOL, CABRAMACHISMO E O CRAQUE

Jarbas Gomes Machado Avelino
Advogado, Professor e Historiador


Futebol é cultura? Desde que se pense cultura como algo ordinário, fazer humano, a resposta é afirmativa. E se a cultura é o lugar onde são construídas significações, interpretações, sentidos sobre o real, é razoável imaginar que o futebol, enquanto manifestação cultural, é uma prática social que reproduz, reafirma, sentidos, valores, modos de ver e sentir socialmente elaborados. Ou seja, o futebol é um espelho da realidade.

Embora não discorde totalmente desta perspectiva, o que proponho aqui é algo um pouco diferente: que tal ler o futebol, em seu acontecer, não como a expressão de valores socialmente compartilhados, mas como lugar social a partir do qual se instauram, se fundam, se veiculam representações e valores em torno do real, com o futebol deixando de ser espelho, projeção, para se converter em espaço de invenção de um real enquanto virtualidade.

Ultrapassada a premissa, proponho que se veja o futebol como um espaço social onde a violência, física e linguística, parece gozar de ares de licença poética. Lugar onde mulheres e homens se irmanam no exercício panfletário de xingar o adversário. E as crianças, desde cedo, parecem ser iniciadas num ritual recorrente de virilidade linguística. A propósito, quem nunca ouviu o cântico de uma torcida, além de exaltar seus ídolos, alfinetar, agredir o adversário, atribuindo à comunidade imaginada que ocupa o outro lado da arquibancada adjetivos que, na simbologia do futebol, seriam desonrosos, entre os quais, a atribuição de modos femininos ao adversário, a caracterização do outro como cabra menos macho.

Essa exortação do cabramachismo no futebol encontra ressonância, dentro de campo, no jogador violento, por vezes, denominado xerife, o qual personifica atributos tipicamente masculinos: a valentia, a coragem, a força, o poder, a virilidade, o espírito conquistador daquele herói bárbaro que habita dentro de cada torcedor. O xerife representa o realismo no futebol, a morte da fantasia, o pavor ao erro, a enorme dificuldade da vitória, que parece sempre esbarrar no modo rústico de tratar a bola, objeto totêmico arredio à truculência e à falta de jeito.

No pólo oposto ao xerife, ao zagueiro viril, o futebol oferece o craque, o camisa 10, o jogador que desafia a métrica, subverte a regra, aquele que nos faz acreditar na magia, que não teme errar, que faz ruir muros concretos em segundos, que abre brechas onde só parecia existir o concreto, inventa espaços, diluindo as fronteiras entre o sonho e a realidade, a verdade e a ficção.

A torcida, ao sabor da ocasião, transita entre a exortação ao xerife, e juras de amor ao craque.

Nesse movimento dialético entre força e delicadeza, entre o masculino e o feminino, é o xerife o jogador que redime nosso senso de cabramachismo, ao investir contra a perna do adversário, mediante a adoção de táticas de guerra, para parar a genialidade do craque.

De sua parte, o craque, com charme, sutileza, e maior senso de abstração, movimentos harmoniosos e de apurada sensibilidade, faz lembrar a bailarina. A sua arma é o drible, esse riso nobre e altivo, como confirmação da estética de uma delicadeza tão apreciada no futebol, sobretudo o brasileiro.

A valentia do zagueiro sem recursos confirma a estética bárbara do poder e da força, ao tempo em que o drible é a positivação da estética da sutileza, que tanto lembra a delicadeza da mulher.

É certo que cada qual conclui o que quiser. Já eu, sendo brasileiro, não consigo vislumbrar o futebol como lugar onde se possa propor uma realidade marcada pela valentia do xerife apenas, mas pela afirmação de masculino e feminino como alteridades sem as quais só resta a intolerância e a barbárie.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Segue texto referente a decisão do Juiz da 4ª Vara da Família e Sucessões de Teresina, Antônio de Paiva Sales, extraído do sítio do TJ/PI, que reconheceu em sentença a união estável de duas mulheres que conviveram por cerca de dez anos, tendo, para tanto, fundamentado seu entendimento no art. 5º, da CF e na Lei de Introdução para uso da analogia.

A decisão merece aplausos por seu viés hermenêutico constitucional e pelo seu pioneirismo:

"PI é pioneiro em sentença envolvendo relação homoafetiva.


O Juiz da 4ª Vara da Família e Sucessões de Teresina, Antônio de Paiva Sales, reconheceu em sentença a união estável de duas mulheres que conviveram por cerca de dez anos. No Judiciário Piauiense, essa é a primeira decisão a reconhecer união estável entre pessoas do mesmo sexo.

No pedido inicial, feito pela Defensoria Pública do Estado, a autora pleiteia o reconhecimento judicial da união estável que ela manteve com sua companheira, falecida há três anos. Em 2009, o Instituto de Previdência do Município de Teresina - IPMT já havia reconhecido administrativamente a união entre as duas mulheres, concedendo, inclusive, pensão à convivente sobrevivente.

Na sentença, o magistrado invoca o art. 5º da Constituição Federal e a Lei de Introdução ao Código Civil (para fins de analogia) e conclui que:

"mesmo não expresso na Lei, mas sendo costumeiro se ver a relação entre pessoas do mesmo sexo vivendo como casal e com coabitação, reciprocidade, ajuda mútua, carinho; enfim, equiparado à relação de marido e mulher, forçoso é o reconhecimento da união estável, entre pessoas do mesmo sexo."

Agora a autora da ação pleiteará na Justiça a anulação do inventário que tranferiu a propriedade da casa que construiu com sua ex-companheira para o nome dos pais desta. "Essa decisão judicial me deixa muito feliz, mas as marcas da dor e do sofrimento que passei ainda estão vivos em minha memória", afirma a autora M. T. O. C (por se tratar de um processo de herança, o nome da parte é substituido por suas iniciais).

Para a Liga Brasileira de Lésbicas, a sentença do juiz reforça a tese do movimento LGBT de que as uniões entre pessoas do mesmo sexo devem ser igualadas às uniões estáveis heterossexuais. A Liga aponta ainda para o caráter “vanguardista” da decisão no Estado."

Fonte: http://www.tjpi.jus.br/site/modules/noticias/Noticia.mtw?id=1948